quarta-feira, 27 de abril de 2011

Justiça acata liminar de associação e suspende projeto Nova Luz

Folha de São Paulo
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Justiça acata liminar de associação e suspende projeto Nova Luz
 
JULIANNA GRANJEIA
DE SÃO PAULO

O Tribunal de Justiça acatou o pedido de liminar de uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade) impetrada pela ACSI (Associação dos Comerciantes da Santa Ifigênia) contra a lei que permite a concessão urbanística. A decisão suspende o projeto Nova Luz --que pretende revitalizar a região central de São Paulo.
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Comerciantes da rua Santa Ifigênia, tradicional centro de compras de eletrônicos, se posicionam contra o projeto desde a apresentação do projeto, em dezembro. Eles dizem que serão prejudicados pelas desapropriações e já organizaram diversos protestos.
O advogado Kiyoshi Harada, que assina a ação, afirmou que a lei fere a Constituição ao conceder o direito a empresas --que vencerem a licitação-- de desapropriar e revender imóveis.
"Viola em bloco o principio da legalidade, da moralidade e da finalidade porque delega para particular um poder que a própria prefeitura não tem. A prefeitura não tem poder para desapropriar um imóvel para revender então como pode permitir que particular faça isso? É especulação", questiona o advogado.
A decisão é do desembargador Souza Lima, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça, e foi publicada na segunda-feira (25). Ele entendeu que o projeto da prefeitura pode ser uma "ampla intervenção urbanística sem observância do devido processo legal".
"Alem disso, é evidente o periculum in mora [perigo da demora] em razão da possibilidade concreta de danos irreversíveis aos imóveis dos associados do autor face às desapropriações previstas nas normas legais impugnadas", afirmou o desembargador em sua decisão.
O advogado também afirmou que a associação não é contra a reurbanização, a requalificação urbana ou a modernidade urbanística. "Porém, tudo deve ser feito dentro da lei, da Constituição. Não somos contra a operação Nova Luz, mas não tem como dar concessão para particular tomar sua casa. Da parte da casa desapropriada, faz uma obra com destinação pública e o remanescente é vendido, arrendado", afirmou Harada.
A Prefeitura de São Paulo informou que não foi citada, que não irá se manifestar sobre a decisão, mas que irá recorrer quando houver citação.

NOVA LUZ
O projeto da Nova Luz, feito pelo consórcio formado pelas empresas Concremat Engenharia, Cia City, Aecom e FGV (Fundação Getúlio Vargas), contempla a área delimitada pelas avenidas Cásper Líbero, Ipiranga, São João, Duque de Caxias e rua Mauá.
O objetivo do projeto urbanístico é incentivar o uso misto do bairro, onde os pavimentos térreos sejam ocupados por comércio e os pisos superiores tenham escritórios e residências.
Para isso, 50 mil m2 de áreas residenciais e 300 mil m2 comerciais sofrerão intervenções. A empresa que ganhar a licitação para executar o projeto irá desapropriar ou comprar esses prédios, demolir e reconstruir. Serão mantidos imóveis tombados pelo patrimônio histórico.
O cadastramento das famílias que moram no perímetro do projeto começou em março

sábado, 23 de abril de 2011

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Por que milhares de centenas de pessoas insistem em viver em condições de moradia extremamente adversas?[1]


A cidade acorda e sai pra trabalhar
Na mesma rotina, no mesmo lugar
Ela então concorda que tem que parar
Ela não discorda que tem que mudar
Mas ela recorda que tem que lutar

Trecho de Conformópolis de Di Mello


No inicio do mês de Abril o departamento de Ciências Sociais da PUC SP promoveu sua aula inaugural de maneira pouco comum entre o meio acadêmico, na ocupação Prestes Maia n° 911, a maior ocupação por moradia digna da América Latina (Veja matéria completa publicada no sitio do CMI).
Dentre as falas de moradores e lideranças dos movimentos presentes (Movimento Sem Teto do Centro - MSTC e da Frente de Luta pela Moradia - FLM) pude perceber como é claro e evidente a seguinte afirmação: “Queremos morar no centro”. “Aqui estou perto do trabalho” ou “aqui tem cinema e teatro, lazer [...]” enfim moradia e acesso à cidade caminham imprescindivelmente juntos.

Deste modo a luta pela moradia digna implica ao mesmo tempo o direito a habitação e a necessidade de mobilidade e do acesso a cidade. Deste modo o centro da cidade se configura como espaço de disputa desde seu inicio e sobretudo ganha maior intensidade a partir do século XIX. Diversas políticas habitacionais e reformas urbanas iram ser criadas, fortalecendo o processo da “periferização” da cidade. Do século XIX até os anos 1940 se produziu uma cidade concentrada em que os diferentes grupos sociais se comprimiam numa área urbana pequena e estavam segregados por tipos de moradias. A segunda reforma urbana, a centro-periferia, dominou o desenvolvimento da cidade doas anos 40 até os anos 80. Nela, diferentes grupos sociais estão separados por grandes distancias [...][2]
Paulatinamente após os anos 50 o centro da cidade irá decrescer econômica e demograficamente. E irá chegar em seu ápice de degradação segundo Lúcio Kowarick nos anos 80. “O centro da cidade abriga 600 mil habitantes em cortiços, 10 mil ambulantes, 2 mil catadores de lixo e cerca de 5 mil moradores de rua [...]. Muitos empreendimentos, cujas matrizes estavam sediadas na Área central, deslocaram-se para as avenidas Paulista e Faria Lima e, mais recentemente, para o eixo Berrini-Marginal do Pinheiros[3] .
Morar no centro da cidade significa reduzir os custos e tempo com transporte. Além de melhores ofertas de emprego, lazer e educação, por serem melhores equipadas em relação as periferias.  Quando a questão da moradia retorna ao centro, o que estamos rememorando é um verdadeiro retorno aos primeiro decênios do século XX, onde com a redução dos chamados cortiços ou casas de cômodo junto a substituição do bonde pelo ônibus e como conseqüência o surgimento de novos bairros, assim como acontecia com os antigos suburbios-estação que beiravam a linha do trem, dentre outras reformas além dos ideários eugênicos, as elites por fim realizam um antigo sonho: a separação em local de trabalho e moradia.



 Alan Fernandes
  



[1] Kowarick em seu livro Viver em Risco (2009)
[2] CALDEIRA, T. P. do R. Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo, Ed. 34/ Edusp, 2000. p. 211
[3] KOWARICK, Lúcio. Viver em risco. São Paulo. Ed.34, 2009. p 106

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Periferia S/A: São Paulo um breve relato


No inicio do século São Paulo era uma cidade concentrada. Diferentes classes se agrupavam no mesmo espaço, mas não quer dizer sob a mesma maneira. Neste momento a elite vivia em casas próprias bem estruturadas e para o restante dos trabalhadores de baixa renda a opção era o aluguel em casas de cômodo – em sua maioria cortiços ou em vilas operarias. Os domicílios alugados em São Paulo de 1920 correspondem a 79% do total de unidades habitacionais então existentes (KOWARICK, 2000. p.27). Com isso a construção de casas de aluguel gerava um negócio extremante rentável. Logo os cortiços e casas de cômodo serão regra até os anos 40.
 Como solução pra crise de crescimento populacional na capital em 1938 o então prefeito Prestes Maia e o também engenheiro de formação João Florence, irão implantar na cidade o “Plano de Avenidas”. De acordo com Maria Teresa Pires do Rio Caldeira (1984, p.16) “Este plano propunha a abertura e o alargamento de uma série de avenidas e radiais que partiam do centro em direção aos bairros e procurava criar uma cidade baseada no transporte. Para isso, desapropriou inúmeras construções e alterou radicalmente vários setores da área central, renovando e ampliando a zona comercial, incentivando a verticalização e a especulação imobiliária e, conseqüentemente, expulsando a população de baixa renda”. Deste modo o bonde passa a ser paulatinamente substituído pelo ônibus.
 Para que este processo se consolidasse  loteadores passam a ater um papel principal. De acordo com as observações de Bonduki e Langenbuch[1], foram em geral os loteadores particulares, pequenos e médios, que abriram uma infinidade de lotes na periferia – não importava o local desde que pudesse contar com uma linha de ônibus impulsionados pelo plano de avenidas. Estes eram vendidos de acordo com o orçamento dos trabalhadores de baixa renda. Portanto temos uma extensão dos antigos “subúrbios-estação”, onde as pessoas se instalavam próximas às estações de trem, agora agregados as linhas de ônibus recém criadas[2].  Deste modo estes novos núcleos pós anos 40, surgem de forma totalmente aleatória tendo como referência apenas as linhas de ônibus recém criadas. Esta intervenção no espaço público urbano começa a indicar a maciça separação entre moradia e local de trabalho – levando a periferização da cidade. “Causando um esvaziamento populacional dos antigos bairros operários que circundavam os centro da Cidade: Brás (-15,5%), Mooca (-5,4%), Bom Retiro (-16,5%), Santa Efigênia (-5,5%), Sé (-8,0%), Bela Vista (-3,5%), Liberdade (-0,5%)” (PAOLI e DUARTE, 2004. p. 69).  Em contraponto, o centro passa rapidamente a verticalizar-se, passando a ser uma zona terciária com aumento de bancos e escritórios. Concretizando o antigo sonho das elites.
Portanto, como citado anteriormente este quadro abrirá caminho para um agente fundamental para a consolidação deste crescimento desordenado e sobretudo periférico – os loteadores e os lotes irregulares. Que ganhará mais força a partir da “Lei do Inquilinato” (1942), está irá congelar os preços dos aluguéis até 1964 (a principio seriam apenas por dois anos). Com isso o aluguel passa a não ser um investimento rentável como nas décadas anteriores e muitos cortiços e cômodos de aluguel serão demolidos (ver tabela 1). Deste modo a cidade deixa de ser concentrada e os trabalhadores de classe baixa já não moram mais no centro tampouco próximos a elite, sendo forçados a irem morar cada vez mais longe e sem nenhuma infra-estrutura.

Tabela1: Montada a partir de dados de Lúcio Kowarick (2000, p.27)

Ano
1920
1940
1950
1970
1980
1991
Domicílios
alugados
79 (%)
75 (%)
68 (%)
38 (%)
40 (%)
29 (%)
Segundo Kowarick, a queda não se dá em conseqüência do incremento da casa própria e sim do crescimento da população favelada. Que atinge, cerca de 20% da população paulistana em meados dos anos 90.


 Enquanto que no período 1940/50 o centro passa por um decréscimo habitacional, a áreas correspondentes aos subúrbios e bairros periféricos  crescem mais de 10% ao ano em bairros não equipados e antes nunca ou esporadicamente habitados.
A habitação como parte de um instrumento de aceleração econômica gerou traços irreparáveis a cidade. Cabe notar que os lotes irregulares, mas adquiridos de forma legal por seus moradores, praticamente não sofreram nenhum impedimento por parte do Estado. Loteadores clandestinos agiram livremente se aproveitando da ocasião. Cabe lembrar que o Banco Nacional de Habitação criado em 1964, não privilegiou as camadas de baixa renda, agravando a situação. Entre 1964-77, aplicou nada menos que a soma de 1935 bilhões de cruzeiros, financiando 1 milhão e 739 mil habitações que foram destinadas de modo particular a famílias com rendimentos superiores a 12 salários mínimos.
Deste modo a periferia terá como característica principal à ausência – esta como parte crucial de uma complexa estrutura de segregação sócio-espacial. Por exemplo, segundo dados de Caldeira em 1980 na região de Itaquera, Brasilândia e São Miguel Paulista, apenas 19,1% das residências possuíam rede de esgoto e só 4,9% telefone. Em contrapartida Perdizes, Pinheiros, Jardim América e Vila Madalena, 97,6% estão ligados à rede de esgoto e 73,2% possuem telefone.
Acompanhando o surto do crescimento populacional da cidade, as favelas iram se proliferar na década de 50 sobretudo por imigrantes recém chegados, que não tinha condições de adquiri lotes nem que estes fossem em bairros distantes. Em 1958, tínhamos 1,3% da população residindo em favelas; Em 1968 com ações de desfavelização este número cairá para 0,8%; Mas 1974, já abrigará novamente 1,6% da população[3]. 
Na década da 1960, São Paulo já adquire seu perfil atual. Atendendo a primeiro a interesses privados, a periferia irá se expandir sem planejamento, ocupando primeiro para posteriormente cuidar da infra-estrutura, que obviamente é feita, quando é feita, de forma gradual e insuficiente. Cabendo aos movimentos sociais um papel importante para possíveis conquistas. Sem nenhuma ajuda, a edificação fica por conta do processo de autoconstrução. Logo como sugere Caldeira, temos o binômio loteamento-autocontrução, como caracterização das chamadas periferias. 


[1] Citados por KOWARICK, 2000.
[2] René Rémond em seu livro “O Século XIX”, coloca que a “revolução dos transportes produz efeitos a análogos; as estações dão origem a novos bairros, à vezes até a novas cidades (estações de triagem, troncos ferroviários)” ou seja, os processos urbanísticos (reservando suas especificidades) têm a questão dos transportes como algum comum que explica em parte o crescimento mundial da população urbana. E como seqüência as formações das periferias.
[3]Dados retirados de Caldeira, 1984.



Alan Fernandes
Este texto é parte de meu TCC: Segregação espacial: O espçao urbano em conflito (2010)


Bibliografia


CALDEIRA, T. P. do R. Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo, Ed. 34/ Edusp, 2000.

CALDEIRA, T. P. do R  A Política dos Outros: Cotidiano dos moradores da periferia e o que pensam do poder e dos poderosos. São Paulo, Brasiliense, 1984.

KOWARICK, Lúcio. Escritos Urbanos. São Paulo, Ed. 34, 2000

PAOLI, Maria Célia e DUARTE, Adriano. São Paulo no plural: espaço público e redes de sociabilidade in PORTA, Paula. (Org.) História da cidade de São Paulo: Vol. 3. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

ROLNIK, Raquel. Cada um no seu lugar! São Paulo inicio da industrialização, geografia do poder. São Paulo, 1981. Dissertação de Mestrado apresentada a FAU/ USP

Emergências

Texto inaugural escrito em 19/3/2011

  

Em uma sociedade de controle, as experimentações cotidianas da vida em geral, aparecem por muitas vezes limitadas. Como se existissem muros ou cercas imaginárias que limitam nossas ações, deslocamentos e pensamentos, através de  leis inquestionáveis. O discurso de uma vida melhor, assim como da segurança, tornam-se dogmas inquestionáveis. Seu uso maniqueísta faz com que sentimos em nosso corpo o peso de se viver sob um consenso comum, onde qualquer sinal de resistência é visto como uma contra-regra que deve ser eliminada. Ou é resumido pejorativamente em apenas uma palavra: revolucionário – Jovem militante aspirante a intelectual entre 18 a 29 anos em média que não trabalha tampouco constituiu família. 
Portanto, as problematizações do presente faz com que nosso corpo busque novas formas de ser. Já não cabem mais promessas futuras, onde uma nova sociedade irá superar a ordem atual. Assim como determinadas formas de lutas e resistências, que cabem a seu tempo e processo histórico. Logo a contemporaneidade  surge como uma urgência a ser pensada, a ser sentida.
Construir uma história do presente, requer re-significar a existência, e de fato existir no mundo. Ações individuais sempre acarretam em ações coletivas, não existes métodos nem modelos. Re-significar a vida também perpassa pelas palavras. Que não devem ser  esquecidas, pois as palavras estão carregadas de história, de sentido. Questionar antigas denominações também é re-siginifica-las. Hoje Picasso virou carro de luxo, Liberdade, campanha de celular. A naturalização dos processos históricos é a mônada do censo comum.
O que buscamos é algo inexistente, são palavras politicamente inomináveis sobretudo a serem construídas em qualquer tempo e espaço.